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20 de Abril de 2024
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    Gandarela tem Paleotoca de tatus gigantes, extintos há 10 mil anos

    No dia 29 de março de 2011, o professor Francisco Buchmann (UNESP/São Vicente), pesquisador do Projeto Paleotocas, disse em palestra em Belo Horizonte, que uma das cerca de 200 cavidades já identificadas na Serra do Gandarela, a 40 km da capital mineira, é uma paleotoca.

    Aguardamos até hoje a publicação de algum artigo seu sobre esta importante descoberta e sua relevância científica e decidimos, após localizar fotos da mesma, divulgar a sua existência como uma forma não só de trazer a conhecimento público este patrimônio de valor incalculável como também de protegê-lo a partir de outras providências que estão sendo tomadas junto aos orgãos competentes. Isso porque a paleotoca está inserida no conjunto de cavidades localizadas na porção norte da Serra do Gandarela, área na qual a Vale tenta licenciar o projeto Apolo.

    Fotos A, B e C em cavidade na Serra do Gandarela (Acervo do Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela). A imagem da direita, logo acima, foi publicada em 2009, pela Agência Fapesp (http://agencia.fapesp.br/10471#.UFuuP5cLNFk.email) ilustrando matéria sobre a pesquisa do professor Buchmann.

    Na figura acima, a poligonal original do Parque Nacional da Serra do Gandarela e principais sítios espeleológicos (de acordo com cadastro do Cecav/ICMBio). No retângulo vermelho, o conjunto de cavidades no qual se encontra a paleotoca. É nesta área que a Vale tenta licenciar a mina Apolo.

    A Vale e a paleotoca

    No dia 27/2/2009 a Vale S.A. requereu, ao Conselho Consultivo da APA SUL RMBH, anuência prévia para o Projeto de Lavra para Amostragem Mineral para Teste industrial, a ser realizada em dois pontos, em processo de licenciamento ambiental para Autorização Ambiental de Funcionamento (AAF). A proposta da empresa era retirar 16.500 toneladas do Ponto 1 e 19.200 toneladas do ponto 2 e levar em caminhões para a Mina de Brucutu para realizar teste industrial. Naquela época desconhecíamos o que havia nos dois pontos, mas consideramos muito estranho o licenciamento, porque a Vale já conhecia o teor do minério de ferro da Serra do Gandarela. Atuamos junto ao Conselho, levamos a denúncia ao Ministério Público e a Vale S.A. não conseguiu a autorização ambiental de funcionamento. Hoje sabemos que um dos pontos era precisamente o local onde fica a paleotoca de tatu gigante, e fica a dúvida: será que a Vale S/A, que nessa época estava finalizando o Estudo de Impacto Ambiental para a mina Apolo, tentou destruir a paleotoca de tatu gigante na Serra do Gandarela ?

    Paleotocas e tatus gigantes

    O termo paleotoca (derivado da palavra grega paliós, que significa antigo) se aplica a tocas de animais extintos, de épocas geológicas passadas.

    Na Paleontologia, as paleotocas fazem parte da Icnologia [ramo da geologia que lida com traços e rastros do comportamento dos organismos, tais como tocas e pegadas (Wikipedia). Etim.: Iknos = vestígio], já que não se trata de ossos fossilizados de animais extintos, mas sim de feições deixadas por eles, da mesma forma que pegadas, fezes fossilizadas (coprólitos) e outros. As paleotocas são, portanto, os maiores e mais bem preservados icnofósseis do mundo.

    A pesquisa das paleotocas e crotovinas que a equipe do Projeto Paleotocas vem desenvolvendo está mostrando que estamos lidando com restos de abrigos subterrâneos de animais pré-históricos. Um abrigo subterrâneo deve ser entendido como um complexo de túneis e câmaras interconectados, desenvolvendo-se em vários andares, com várias entradas e saídas para a superfície. Os túneis sobem e descem dentro da montanha. Os túneis individuais podem atingir 100 metros de comprimento e o abrigo, como um todo, tem um raio de pelo menos 100 metros. Quando uma escavação expõe restos de um abrigo subterrâneo, alguns dos túneis são encontrados abertos (e chamados de paleotocas) [...] A definição de tamanho de um túnel só pode ser feita com segurança se o túnel apresenta paredes originais, sem erosões, desabamentos, etc. (http://www.ufrgs.br/paleotocas/Portugues.htm)

    Os tatus gigantes viveram na América do Sul por milhões de anos, até cerca de 10 mil anos atrás e fazem parte da Megafauna Pleistocênica Sul-Americana, à qual também pertencem outros animais gigantes como o Mastodonte (sul-americano), o Megatherium (preguiça gigante) e o Gliptodonte (animal parecido com o tatu, mas do tamanho aproximado de um automóvel).

    Os tatus gigantes chegavam a 250 quilos de peso e havia vários gêneros e muitas espécies, como os Eutatus, os Propraopus e os Pampatherium. Ainda não se tem certeza qual deles cavava a terra e fazia as paleotocas e uma definição mais precisa a respeito dos organismos escavadores somente será obtida com um grande número de paleotocas, de preferência com muitas marcas de garra nas paredes, de acordo com o Projeto Paleotocas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul .

    Propraopus grandis

    Pampatherium

    Um número significativo de cavernas de formações ferruginosas de Minas Gerais vem sendo destruída pela atividade de mineração de ferro. O Conselho Estadual de Política Ambiental é regimentalmente dominado por maioria governamental e empresarial que vem autorizando as supressões de cavernas, vegetações em estágios avançado de regeneração e a degradação de córregos com água de alta qualidade. Embora o licenciamento de intervenções em cavernas seja legalmente uma atribuição federal, o Ministério do Meio Ambiente tem delegado aos estados deliberar sobre o assunto.

    Vida nas cavernas ferruginosas

    Estudos já publicados revelam que a biodiversidade das cavernas ferruginosas é muito superior à das cavidades em outras formações geológicas.

    Marconi Silva, Rogério Martins e Rodrigo Ferreira, o primeiro e o último pesquisadores da Universidade Federal de Lavras, revelam, em artigo de 2011 , consideráveis diferenças quanto à riqueza, abundância e diversidade de espécies observadas em 91 cavernas de diferentes litologias situadas no domínio da Mata Atlântica no Brasil. A maior média relativa (por extensão linear em cavidades), como ilustra o gráfico acima está nas cavernas ferruginosas (5,3 spp/caverna), enquanto nas cavernas carbonáticas, foi registrada a média de 3,2, nas magmáticas, 2,4, e nas siliciclásticas, 0,05 espécies por caverna. Já os invertebrados troglomórficos têm média relativa muito superior nas cavernas ferruginosas: 5,79 spp/cav X 1,86, 1,83 e 1,60 spp/cav, respectivamente, em cavernas siliciclásticas, magmáticas e carbonáticas.

    De acordo com Maurity e Kotschoubey (1995)

    a couraça da canga possui cavidades, fissuras, bolsas e sistemas tubulares interconectados. A existência de grande volume de canalículos estabelece uma rede de articulação de espaços intersticiais (micro e mesocavidades) conectadas com macrocavidades, configurando sistemas ferruginosos subterrâneos como habitats de grandes extensões. A amplitude e número destes sistemas subterrâneos podem estar diretamente relacionados à variedade e à influência destes habitats na sustentação de uma fauna valiosa. De acordo com Ferreira (2005) as microcavidades são usadas por um número incontável de organismos que transitam da superfície para áreas internas, alcançando frequentemente as macro-cavidades. [tradução livre]

    Em resumo esse sistema de vasos interligados por onde passam organismos e sedimentos os mais variados cria um ecossistema particular que alimenta um ciclo de vida de várias espécies que transitam exclusivamente em cavernas, como também entre o ambiente delas e os espaços superficiais conectados.

    Em resposta a consulta feita pelo Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela, a bioespeleóloga Eleonora Trajano (Departamento de Zoologia IBUSP) observou que

    Para se determinar com confiança o grau de endemismo de uma espécie no que diz respeito à sua condição de possível troglóbio é imprescindível estender a investigação a áreas epígeas e outras áreas cársticas da região [...]

    Cavernas não são entidades independentes e isoladas completava , elas estão inseridas no contexto geológico e biológico regional, fornecendo abrigo, local de reprodução, alimento etc. para espécies regularmente encontradas na superfície. Cavernas são particularmente importantes para os chamados trogloxenos obrigatórios, como vários morcegos e certos opiliões nos Estados Unidos, há casos bem documentados de espécies de morcegos quase levadas à extinção por conta de impactos em uma ou pouquíssimas cavernas.

    Conclusão

    A descoberta da paleotoca na Serra do Gandarela, assim como a publicação de novos estudos científicos que revelam a importância das cavidades ferruginosas para a preservação de espécies zoológicas muito raras, algumas das quais sequer descritas pela ciência, vêm reforçar a necessidade da criação do Parque Nacional da Serra do Gandarela. Sua missão é salvaguardar esta riqueza, antes que não reste no Quadrilátero Aquífero e Ferrífero de Minas Gerais nenhuma área de proporção significativa a ser preservada.

    O Parque Nacional da Serra do Gandarela deverá proteger estes raros sítios ainda pouco explorados por paleontológos, biólogos e pesquisadores e público interessado em desvendar as nossas origens, assim como das espécies precedentes que aqui viveram.

    A divulgação destes fatos é uma importante contribuição dos meios de comunicação para a proteção desse tesouro.

    Serviço:

    O quê: Gandarela tem Paleotoca de tatus gigantes, extintos há 10 mil anos

    Mais informações: Teca (31) 9385-1339 Paulo Baptista (31) 9957-2825

    Gandarela Informa (2 ? Edição):

    Gandarela tem Toca de Tatu Gigante, extinto há 10 mil anos

    Site: www.aguasdogandarela.org

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